Termine bem!

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Diferentemente de Deus, que é imutável, seres humanos experimentam mudanças. É um elemento integral de nossa experiência terrena. Quando reconhecemos nossa pecaminosidade, nos tornamos gratos pela habilidade de mutabilidade, a medida que a obra santificadora do Espírito de Deus gradualmente nos molda e define a uma semelhança cada vez maior com Cristo (II Co 3.18).

Ademais, o Senhor projetou nosso mundo para que passasse por um processo de mudança perpétua (Gn 8.22). A realidade é que muitos não experimentam mais as tardes quentes geralmente associadas ao verão. Pelo contrário, nós recentemente começamos a sentir o frio, o ar gelado do outono. Quando olhamos ao redor, nós vemos as cores vívidas das folhas mudarem e caírem no chão. A beleza estonteante dessa convergência de estações nos lembra que nosso Deus soberanamente orquestra o tempo de todas as coisas com precisão profunda. Isso também nos ajuda a lembrar, mesmo com os desafios da vida, que as estações e circunstâncias de nossas vidas estão completamente debaixo de Seu Senhorio e controle. Como o teólogo holandês do século 19, Abrahan Kuyper disse:

Não há um centímetro quadrado em todo o domínio de nossa existência sobre o qual Cristo, que é soberano de todos, não possa gritar: é meu.

Essa é uma realidade especialmente consoladora quando nos deparamos com as transições da vida. Seja quando deixamos um emprego e começamos outro, mudar de uma comunidade para outra, ou até mesmo ao se aposentar de uma longa carreira e começar uma nova estação da vida, transições são inevitáveis. Esse conceito também é verdadeiro no que diz respeito ao ministério pastoral e missionário, como percebemos evidenciado na vida do apóstolo Paulo. Durante todo o período de vida de Paulo como ministro do Evangelho, o Senhor soberanamente direcionou cada passo seu durante todo o caminho. Paulo frequentemente desenvolvia seus planos ministeriais, mas as circunstâncias mutáveis providencialmente ditaram quando e onde Paulo viajaria em seguida (At 16.6).

Em atos 20, nós encontramos um exemplo de como Paulo navegou por entre essas transições no ministério. Contextualmente, o apóstolo investiu tempo ministrando em Éfeso e posteriormente passou por um período de hostilidade.  Uma rebelião se instalou depois que Paulo pregou o Evangelho em Éfeso, mais cedo do que ele imaginava. Ainda assim, em meio a tudo isso, embora as circunstâncias e as estações da vida de Paulo estivessem sempre mudando e eram frequentemente imprevisíveis, pela graça de Deus, sua perspectiva centrada no Reino nunca mudou.

Ele provê encorajamento

Nós vemos a abordagem apostólica nos dois primeiros versos de Atos 20. Diz assim:

E, depois que cessou o alvoroço, Paulo chamou a si os discípulos e, abraçando-os, saiu para a macedônia. E, havendo andado por aquelas terras, exortando-os com muitas palavras, veio à Grécia. (Atos 20.1-2)

Observe que primeiro, enquanto Deus move Paulo de um lugar para outro, mesmo que de maneira repentina às vezes, o apóstolo não se concentra na rejeição pessoal ou se deixa levar pela auto piedade. Em vez disso, durante esses períodos de transição, Paulo procura ser um encorajamento para os outros.

 Ele está intencionalmente acompanhando os santos que estão servindo e ministrando em vários lugares, e encontra maneiras de edificá-los e fortalecê-los em sua fé.

Por que isso é importante? Bem, porque nem sempre os crentes são bons em encorajar uns aos outros. De fato, nós muitas vezes desencorajamos as pessoas sem ao menos perceber. Nós desencorajamos quando:

  • Somos demasiadamente duros ou críticos
  • Somos desrespeitosos ou ofensivos
  • Somos invejosos ou ciumentos
  • Somos impacientes
  • Fofocamos

Esses são apenas alguns exemplos de como os crentes algumas vezes desencorajam uns aos outros, são um veneno para a saúde da igreja local. Ainda assim, o encorajamento é um fator que todos precisamos, especialmente durante tempos de transição (Rm 1.11-12). Então, independentemente das circunstâncias, ao invés de nos focarmos em nós mesmos, vamos nos focar no reino e lutar contra o desencorajamento.

Ele deseja ser um Exemplo

O Curriculum de liderança que Paulo tem é notável. Ao pincelarmos o verso 17 do texto acima, percebemos:

E de Mileto mandou a Éfeso, a chamar os anciãos da igreja.
E, logo que chegaram junto dele, disse-lhes: Vós bem sabeis, desde o primeiro dia em que entrei na Ásia, como em todo esse tempo me portei no meio de vós,
Servindo ao Senhor com toda a humildade, e com muitas lágrimas e tentações, que pelas ciladas dos judeus me sobrevieram;
Como nada, que útil seja, deixei de vos anunciar, e ensinar publicamente e pelas casas,
Testificando, tanto aos judeus como aos gregos, a conversão a Deus, e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo. (Atos 20:17-21).

Mesmo quando Paulo se prepara para partir, perceba que ele busca liderar. Ele não para de se preocupar com os anciãos da igreja em Éfeso em momento algum. Ele não ficou focado no ministério que o espera em Jerusalém. Pelo contrário, com foco no Reino, Paulo quer apresentar, diante desses presbíteros, seu ciclo de serviço e liderança como um exemplo que eles podem seguir depois que ele se for. Certamente, o ministério apostólico de Paulo não foi caracterizado pelo orgulho de seu chamado, felicidade mundana em suas circunstâncias ou confiança em suas credenciais. Ao viver o evangelho diante desses anciãos, o ministério de Paulo foi marcado por humildade, lágrimas e provações.

Paulo não deixou apenas um ministério exemplar e vívido para os anciãos efésios, mas também deixou um exemplo para nós. Quando nós, assim como Paulo, começamos a entender que não merecemos a bondade e favor de Deus, que nos foi mostrado por meio da morte sacrificial de seu Filho, então o peso dessa graça nos humilha, amolece os nossos corações, e se torna o catalizador que nos faz exemplo para outros. É esse exemplo profundo, fiel e transformador que Paulo conclama esses pastores a seguir.

Ele oferece exortação

Em uma de minhas passagens favoritas em toda a Escritura, Paulo busca apaixonadamente exortar os anciãos efésios ao dizer:

Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue.
Porque eu sei isto que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho;
E que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si.
Portanto, vigiai, lembrando-vos de que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós.
Agora, pois, irmãos, encomendo-vos a Deus e à palavra da sua graça; a ele que é poderoso para vos edificar e dar herança entre todos os santificados. (Atos 20:28-32)

A centralidade dessa exortação é o preço que Cristo pagou para comprar a igreja. Esse preço infinitamente valioso, obviamente, foi seu próprio sangue. Para buscar a redenção do povo de Deus, Jesus quis entregar a sua vida na cruz, satisfazendo a completa ira de Deus, e resgatou cada ser humano que se tornou um crente comprado por sangue. A razão pela qual essa é uma verdade importante à ser exposta aos pastores efésios, e para nós, é porque ela aponta para o peso e a imensidão do tesouro que Deus nos confiou. Cristo pagou um preço muito alto para que nós venhamos a ignorar suas instruções.

Portanto, depois de olhar para a trajetória do exemplo e legado que o apóstolo deixou, agora ele olha para frente, e quando ele se prepara para partir, ele exorta os anciãos à fazerem duas coisas. Primeiro, ele os chama a dar uma atenção especial a si mesmos. Como aqueles que foram comprados pelo precioso sangue de Cristo, Paulo admoesta esses homens a atentar para as suas próprias almas. Ele os chama a cuidar persistente e consistentemente da saúde de suas próprias almas, para que possam cuidar adequadamente da saúde da igreja, que o Espírito Santo os capacitou e os chamou para pastorear. Como o pastor escocês do século 19, Robert Murray McCheyne, escreveu uma vez:

A maior necessidade do meu povo é a minha santidade pessoal.

Em segundo lugar, Paulo exorta esses pastores a prestar muita atenção em todo o rebanho. Mais uma vez, o peso dessa exortação se encontra no preço que foi pago. Os pastores são chamados a proteger o precioso rebanho adquirido por Cristo. Para a igreja de Éfeso, especificamente, o apóstolo sabia que eles enfrentariam alguns ataques particularmente sérios nos próximos dias. Lobos, ou falsos mestres, que não querem nada além de usar e abusar das ovelhas para seus próprios objetivos egoístas, eles vão se infiltrar na igreja e ensinar falsas doutrinas.

É por isso que o encargo pastoral no versículo 32 é tão poderoso. Paulo recomenda esses anciãos “a Deus e à palavra de sua graça, que é capaz de edificá-los e dar-lhes herança entre todos os que são santificados”. Que palavra de encorajamento! Que lembrete para esses pastores de que, embora a responsabilidade seja pesada, o poder para cumpri-la não se encontra em suas próprias forças. Em vez disso, as promessas e o poder necessário para pastorear adequadamente são encontrados na presença do grande pastor.

Ele se despede afetuosamente

As palavras finais de Paulo são transmitidas com uma expressão mutua de amor genuíno e afeição pelos anciãos efésios, ele diz:

 De ninguém cobicei a prata, nem o ouro, nem o vestuário.
Sim, vós mesmos sabeis que para o que me era necessário a mim, e aos que estão comigo, estas mãos me serviram.
Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando assim, é necessário auxiliar os enfermos, e recordar as palavras do Senhor Jesus, que disse: Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber.
E, havendo dito isto, pôs-se de joelhos, e orou com todos eles.
E levantou-se um grande pranto entre todos e, lançando-se ao pescoço de Paulo, o beijavam,Entristecendo-se muito, principalmente pela palavra que dissera, que não veriam mais o seu rosto. E acompanharam-no até o navio. (Atos 20.33-38).

Quando Paulo estava prestes a partir, ele lembra os anciãos sobre a natureza da liderança espiritual. Ele enfatiza que liderança não é sobre receber, pelo contrário, é sobre abençoar aqueles que estão debaixo de nosso cuidado. Não é sobre tomar, mas sobre dar aos que necessitam. Não é sobre ser servido, mas sobre servir o próximo. Para Paulo, esse chamado final é motivado por Graça e gerado pelo Evangelho da generosidade. Assim ele se ajoelha e concede uma palavra de oração final com seus irmãos em Cristo. Por causa do grande amor de Paulo, que os serviu ao ensinar bem, esses homens começaram a chorar copiosamente porque sabiam que não o veria novamente. Paulo, igualmente, começa a chorar por causa do seu amor por eles. Essa é uma linda demonstração de comunhão doce que é encontrada no Evangelho de Jesus Cristo. As transições no ministério pastoral não estão debaixo de nosso controle. Independentemente dos detalhes específicos, sempre devemos descansar no fato de que Deus é soberano. Nós podemos até não ser capazes de dizer a duração ou a nossa direção, mas podemos determinar nossas ações. Quando consideramos o exemplo de Paulo, cuja vida foi alcançada pelo Salvador e empoderada pelo Espírito devemos também nos esforçar por terminar bem.

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Kevin Hay | Brasil

Kevin Hay serve como pastor principal da Primeira Igreja Batista em Kenova, West Virginia. Ele é aluno do D. Min. em Pregação Expositiva no The Master's Seminary (Seminário dos Mestres) e é o editor de um livro à ser lançado: “Assurance: Our Confidence in Christ” (Segurança: Nossa confiança em Cristo), de Thomas Goodwin (2022). Kevin e sua esposa, Alicia, têm sete filhos: McKenna, Landon, Meela, Madison, Liam, Levi e Mariah.