Discernindo a Diferença entre erro teológico e Heresia

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A igreja por gerações, de fato, desde o início, experimentou brigas, rixas, diferenças de opinião, discussões e guerras teológicas acerca de erros doutrinários. Em muitos casos ao longo da história, a igreja foi forçada a lidar com essas questões de maneira a exigir separação daqueles que defendem falsas doutrinas. Essa separação é um rotulo para que todos leiam: Esse conteúdo foi devidamente testado como contendo heresia.

Nem todo erro é heresia, mas toda heresia é um erro. Entender a diferença vai prevenir separação desnecessária e capacitará a Igreja a manter tanto a unidade como a pureza.

É criticamente importante exercer sabedoria em como abordamos o erro doutrinário. Nem todo erro é heresia, mas toda a heresia é um erro. Entender a diferença vai prevenir separação desnecessária e capacitará a Igreja a manter tanto a unidade como a pureza.

O que é Heresia?

 Há alguns anos atrás, Dr. Larycia Hawkins, professora titular da Faculdade Wheaton causou um grande alvoroço quando vestiu uma roupa mulçumana tradicional chamada hijab durante a estação do advento. Hawkins é uma cristã professa, mas ela também postou algumas afirmações controversas na sua pagina do Facebook dizendo que ela acredita que cristãos e mulçumanos adoram o mesmo Deus. Ela escreveu o seguinte:

Por favor, faça uma análise coerente sobre a base da minha afirmação no link abaixo – bem como um argumento convincente porque afirmar nossa solidariedade religiosa com muçulmanos e judeus ajudará bastante a reprimir a violência religiosa e atenuar o medo religioso uns dos outros. Quer você acredite ou não nesta posição, mantida por séculos por incontáveis ​​cristãos (pais da igreja, santos e cristãos comuns como eu), seja válida, acredito que podemos discordar pacificamente em pontos teológicos e afirmar outros como o Deus Trino. (embora haja diferenças aqui também – Credo Atanasiano, não?), o nascimento virginal (ou Imaculada Conceição, dependendo de seus argumentos) e a Ressurreição. Que haja unidade em nossa diversidade de pontos de vista sobre todos os itens acima.

No auge da controvérsia, ela escreveu:

Eu advogo a solidariedade para com os mulçumanos porque eles, assim como eu, uma cristã, são pessoas do livro. Assim como o Papa afirmou semana passada: Nós adoramos o mesmo Deus.

Dra. Larycia Hawkings veio eventualmente a perder o seu trabalho por causa de seu erro doutrinário. Embora diversos jornais tenham noticiado que a questão tinha que ver com racismo, a razão pela qual a Dra. Hawkings, uma professora negra que se tornou titular na Faculdade Wheaton, perdeu seu emprego foi por conta de ela ter abraçado um erro teológico gravíssimo. Em resumo, Dra. Hawkings é uma herege. A heresia requer separação. Essa separação é necessária nas esferas acadêmicas bem como nas esferas da Igreja local (Mateus 18.15-20).

Heresia é um erro teológico gravíssimo. É o erro teológico mais severo porque ele ataca as verdades necessárias sobre Deus e a obra da redenção que são necessárias para ser um cristão.

Heresia é um erro teológico gravíssimo. É o erro teológico mais severo porque  ataca as verdades necessárias sobre Deus e a obra da redenção que são necessárias para ser um cristão. As doutrinas cardeais da fé, que são afirmativas necessárias para alguém se dizer cristão, incluem doutrinas tais como a trindade, a deidade de Cristo, o nascimento virginal de Cristo, a ressurreição corpórea de Cristo, justificação pela fé somente em Cristo somente para salvação, a inspiração da Escritura (A Bíblia como um todo é a verdadeira Palavra de Deus) para exemplificar algumas.

Se alguém nega essas doutrinas chave ou uma dessas doutrinas chave, eles estarão fora dos limites da ortodoxia e devem ser classificados como hereges. Por vezes, heresia e erro são separados por um grande abismo. Em outros casos, a linha divisora que separa um herege de um cristão é muito tênue. Em circunstâncias onde a fronteira não parece ser tão óbvia, os falsos mestres podem aproveitar a oportunidade e cruzá-la para chegar até a Igreja e semear confusão. Em Gálatas, Paulo escreve uma carta para a igreja a fim de adverti-los e corrigi-los em relação ao erro teológico gravíssimo. As palavras de Paulo são certeiras:

Maravilho-me de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho;O qual não é outro, mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho de Cristo.Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie outro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema.
Assim, como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema. (Gálatas 1:6-9)

O que separavam os judaizantes do cristianismo verdadeiro era uma pequena palavra: Somente. Eles abraçavam a doutrina da Trindade-Que Deus existe eternamente como um Deus em três pessoas. Eles estavam alinhados com a Igreja em relação a deidade de Cristo. Eles acreditavam e pregavam firmemente sobre a ressurreição de Cristo. Porém, eles se recusavam a abraçar a justificação pela fé somente em Cristo somente. Eles adicionaram a circuncisão à obra de Jesus- o que é heresia. Toda heresia requer separação. Portanto, Paulo admoestou a igreja e exigiu que eles se separassem dessas pessoas. As palavras de Paulo são pesadas, mas necessárias já que ele está defendendo o Evangelho de Jesus Cristo e a fé uma vez entregue aos santos. O que os judaizantes chamavam de verdade, Paulo definiu como erro digno de ser anátema.

Heresia é um termo técnico reservado ao erro teológico que nega a doutrina cristã fundamental necessária à salvação. Ela não pode ser vista como irrelevante. Em Tito 3.10, encontramos essas palavras: “Ao homem herege depois de uma e outra admoestação, evita-o”. A versão ARA utiliza a palavra grega αιρετικὀς” como sendo herege. Outras versões traduzem o termo como: “aquele que causa divisão”. A ARA prefere o título, enfatizando a  transliteração, enquanto outras preferem a definição do termo ou da função do título. As duas traduções estão corretas, e a ideia é que um herege causa divisão na Igreja pela negação da Verdade. .

Quando a pessoa é definida como herege e excomungada da Igreja local, o corpo de Cristo está comunicando que eles não tem razão creditável para crer que a pessoa está na fé e que eles podem continuar recebendo a pessoa como um irmão ou irmã em Cristo.

Quando a pessoa é definida como herege e excomungada da Igreja local, o corpo de Cristo está comunicando que eles não tem razão creditável para crer que a pessoa está na fé e que eles podem continuar recebendo a pessoa como um irmão ou irmã em Cristo. Eles devem ser tratados como hereges. Embora o alvo da vida cristã não seja a separação, algumas vezes a separação é necessária. Existem duas formas principais que são necessárias dependendo das duas diferentes categorias de erro.

Primeiro requisito para separação

Em alguns casos, a igreja deve remover o membro faltoso que persiste no pecado e recusa-se a se arrepender (Mateus 18.15-20). Isso é o que nós chamaríamos de separação primaria. A separação é uma capacidade oficial baseada em razões primarias da fé. Em outros casos, a controvérsia doutrinária exige uma afirmação doutrinaria oficial para prover luz e clareza na linha divisória da heresia. Nós vimos isso no decorrer da história como na heresia ariana em relação a trindade. Essa controvérsia resultou em um credo que comunica as seguintes verdades a respeito de Jesus:

Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai. Por Ele todas as coisas foram feitas.(Credo Niceno-325 D.C)

Quando cristãos se separam de uma pessoa que detém doutrinas que contradizem as questões primarias da fé, eles estão pretendendo apontar essa pessoa (em contexto de igreja local) ou pessoas (em uma esfera mais ampla) como um herege (não ortodoxo e fora da fé cristã) R. C Sproul explica a necessidade dessa separação, ele escreveu assim:

A Igreja sempre teve de lidar com a heresia, e a igreja sempre fez a distinção entre heresia e erro. Não é uma diferença em relação a tipo, mas ao grau. A igreja sempre conteve erros ou, pelo menos, alguns membros que contém erros em seu modo de pensar ou em suas crenças. Porém quando um erro se torna sério ao ponto de ameaçar a vida da igreja e afeta as essencialidades da fé cristã, então a igreja precisa protestar e dizer: “Nós não cremos nisso. Essa falsa crença é heresia e não pode ser tolerada dentro da igreja visível”. Historicamente, é isso que acontecia em relação a  conflitos teológicos.

Questões de separação secundária

Enquanto toda a heresia exige separação da Igreja de Deus, nem todo erro exige o mesmo tipo de separação, Em toda Conferência Nacional do G3, nós desfrutamos de rica comunhão tanto com Batistas como Presbiterianos. De fato, existem varias tradições presentes na conferência do G3. Nós mantemos um relacionamento saudável quando nos ajuntamos debaixo da bandeira do Evangelho. Embora nós nos juntemos em conferências, nos mantemos separados no dia do Senhor uma vez que nos reunimos no contexto de nossas igrejas locais. Nós nos referimos a isso quando falamos a respeito de questões de separação secundaria.

Questões de separação secundarias não podem ser confundidos com “separação secundária” que é a prática geral de se separar das pessoas que não se separam de indivíduos ou grupos que foram classificados como hereges ou se envolveram em pecado sem arrependimento.

Dentro da esfera do evangelicalismo como um todo, existem vozes que vão te criticar por não se separar o suficiente e outras vozes que vão te criticar por qualquer tipo de separação. Nos últimos anos, o G3 foi obrigado a se separar de algumas organizações e indivíduos que escolheram uma abordagem diferente a respeito de justiça social. Em alguns casos, isso resultou em uma crítica aberta a minha pessoa (já que sou presidente da G3). Alguns críticos me definiram como um purista ou separatista ou como escrevi em uma publicação recente-um fundamentalista. Algumas vezes a separação é algo bom, mas ela nem sempre significa que por essa separação nós estamos dizendo que ela ou a organização seja anathema. É uma decisão sábia e cuidadosa para com as igrejas locais que afirmamos servir.

Em matéria de questões de separação secundária à um nível de Igreja local, cristãos individualmente se ajuntarão e adorarão em diferentes igrejas sobre a base de convicções teológicas, posições, filosofia ministerial, e uma variedade de outras razões enquanto ao mesmo tempo mantemos nossa amizade cristã. Alguém que abraça o princípio regulador do culto não vai se juntar a uma igreja que tem uma filosofia ministerial baseada no princípio normativo do culto.

Alguma unidade cristã pode existir entre a diversidade em um contexto mais amplo enquanto seja necessário a separação no contexto da igreja local.

Doutrina importa e questões de separação secundaria, embora necessárias por vezes, não exige que igrejas na mesma comunidade definam umas as outras como heréticas porque elas diferem no princípio regulador do culto. Alguma unidade cristã pode existir entre a diversidade em um contexto mais amplo enquanto seja necessário a separação no contexto da igreja local.

Um chamado a Caridade e Sabedoria

Quando se trata de divisão teológica na Igreja, nós devemos exercitar a sabedoria e a caridade. Não é sábio andar com um martelo na mão para matar mosquitos na sua casa, estraga a mobília. Existem soluções melhores para matar mosquitos. Igualmente, é mais coerente lidar com cobras venenosas de forma diferente de como se lida com mosquitos inofensivos. O maior alvo da vida cristã é um compromisso com a Verdade que produzirá unidade entre os cristãos, mas existem linhas divisórias dentro da fé que não precisam de separação.

Em alguns casos, é possível que a pessoa ensine um ensino herético sem ser um verdadeiro herege no sentido técnico. Se a pessoa é ensinável e tem o desejo de ser corrigida, esse indivíduo precisa ser abraçado como um irmão ou irmã na fé. Em resumo, a sabedoria nos diz que não devemos rotular alguém como herege precipitadamente, requerendo inclusive separação primária, nós precisamos entender suas posições de maneira apropriada.

No que se refere a divisão teológica na esfera do evangelicalismo, nós devemos igualmente exercitar tanto a sabedoria quanto a caridade. Em alguns casos, é possível que uma pessoa afirme o que pode ser considerado um erro, mas que não necessite de separação primaria. É possível ser caridoso com irmãos e irmãs em Cristo em assuntos não essenciais a fé- ainda que esses assuntos sejam questões importantes da teologia.

No que se refere aos dons apostólicos, escatologia, calvinismo, e afirmações de outras questões teológicas que se enquadram na categoria de importância doutrinária, certa dose de caridade é necessária entre os cristãos. A sabedoria nos diz que precisamos abordar as visões diferentes em relação ao batismo de uma maneira e a visão sobre aborto de outra. As questões relacionadas a igualitarismo ou ao véu vão requerer diferentes níveis de separação. Questões relacionadas a teoria crítica racial e interseccionalidade requerem um nível de separação diferente do que a posição relacionada ao consumo de álcool. A sabedoria nos dirige nessas distinções.

O chamado da vida cristã envolve a busca por sabedoria (Pv 4.1-9), mas não qualquer sabedoria- a sabedoria bíblica auxilia uma pessoa a discernir entre um jogo amistoso e uma final de campeonato à nível teológico. Existe uma diferença entre erro e heresia.

A sabedoria nos auxilia não somente a diferenciar erro e heresia, mas igualmente a se contrapor a heresia de maneira franca. Reconhecer a heresia não é o bastante. Ela deve ser contrariada. R.C Sproul escreve:

O relativismo diz: “A verdade é o que você percebe que ela seja, e o que é verdadeiro para você, pode ser falso para outro”. Em nossa sociedade atual, você é completamente livre para acreditar no que quiser, mas se tem algo que você não pode fazer é negar sua antítese. Você pode dizer: “Eu acredito que isso é verdade”. Entretanto você não pode dizer que aquilo que é contrário ao que você acredita é falso. Existe uma geração inteira de cristãos que sofreram lavagem cerebral pelo espírito do relativismo, então eles hesitam em dizer: “Eu sou contra aquele erro ali”. Nós não temos mais concílios porque, no relativismo, não existe heresia.

Entender as linhas de batalha é importante na fé cristã, e esse conhecimento requer sabedoria. O chamado da vida cristã envolve a busca por sabedoria (Pv 4.1-9), mas não qualquer sabedoria- a sabedoria bíblica que auxilia uma pessoa a discernir entre um jogo amistoso e uma final de campeonato à nível teológico. Existe uma diferença entre erro e heresia.

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Josh Buice | Brasil

Josh Buice é o fundador do Ministério G3 e serve como pastor na Pray’s Mill Baptist Church (Igreja Batista Moinho de Oração) na zona oeste de Atlanta. Ele ama teologia, pregação, história da Igreja, e é bastante compromissado com a Igreja local. Ele gosta de praticar esportes, como corrida de longas distâncias e costuma caçar nas florestas do país. Ele tem escrito sobre salvação pela Graça desde que estava no seminário e tem atingido um número relevante de leitores com o passar dos anos.